terça-feira, 29 de novembro de 2011

Assistindo a morte de Uganda


Não vejo esperanças pra Uganda, minha pérola da África. É difícil admitir que Uganda estará 10 vezes pior na próxima geração. É muito difícil para uma pessoa otimista, sonhadora e idealizadora que sou.
Mas é impossível sonhar com outro destino quando Uganda já está condenada. E a culpa não é mais do colonizador, do capitalismo, do sistema e do ocidente (Tá! Eles terão sempre que ser condenados pelo mal que causam e causaram). A culpa é desse governo de 30 anos!!!!
Não há um governo, uma instituição a não ser na parte militar e diplomática no leste africano. Todos os investimentos do governo são nesse sentido: guerra! Seja ela local ou internacional.
O brother tá metido em todos os conflitos da região do leste africano e internamente investe na ditadura, na opressão e nos conflitos do interior do país que se arrastam por décadas e matam milhares de pessoas.
Não há qualquer investimento social e toda a grana do governo, que não é destinada à guerra, vai para o bolso. A corrupção é assustadoramente alta, ainda que comparada à países internacionalmente conhecidos por tal. Museveni vende os recursos de Uganda (floresta e energia, para citar apenas dois exemplos) para benefício próprio.
Ao mesmo tempo em que sonhamos, temos esperanças com o futuro de um país onde o povo e o governo estão dedicados à levar a população às escolas, melhorar sua saúde e educação, trazer investimentos, infra-estrutura, investir na profissionalização, empregos, investir nas instituições estatais, buscar parcerias para a promoção da moradia, água, luz e etc. É fácil imaginar o que ocorrerá em um país que não faz absolutamente NADA nesse sentido. Pelo contrário, tira sua grana e sua atenção é cada vez mais desviada da população e cada vez mais se apóia no bizarro número de instituições humanitárias  e ONGs que são os responsáveis pelas escolas, medicamentos, financiamento de estudantes, profissionalização e etc.
O governo valoriza toda pequena ONG e o maior negócio ugandês é abrir uma. Dessa forma, não é difícil imaginar que a grande maioria dessas instituições são falsas, sem projetos, fácil meio de corrupção e etc. Ao invés delas darem apoio ao governo, que possui suas própria ONGs e instituições de trabalho sociais, às quais fazemos doações frequentemente através dos impostos, elas, em sua maioria, forjam uma assistência nada embasada e recebem muito dinheiro pra isso. Já algumas das grandes organizações, com grana, e algumas das pequenas, atuam de maneira cega, apolítica e assistencial. Salvam a vida de milhares, mas acordam com essa situação que condena os outros milhões.
Não estou falando que o governo deveria seguir esse modelo internacional do FMI de infra-estrutura, investimento internacional e etc, como sendo a chave do sucesso. Mas, quando viajo pro demais países da região, não tem como não comparar e ver a morte do país sem carros, transporte público, estradas, hospitais, escolas...
Além disso, a idealista Barbara, fica sem opção diante de uma oposição fraca, única, sem qualquer estratégia ou objetivo a não ser o de pegar o poder (parece até uma briguinha pessoal com o amigo Museveni). A opressão do governo a qualquer movimento popular, ao invés de gerar mais revolta da população, gera risos (literalmente) e comodismo. Aceitação de um destino, uma vida extremamente miserável.
Vejo a situação das pessoas e não consigo imaginar como seria se estivesse na mesma situação: sem governo, sem esperança, sem estudo, condenado à qualquer pequena doença, sem terras para plantar, preocupada apenas com a comida dia-a-dia, sem água, emprego ou esperança de um (quando visito as pessoas e as ajudo, elas me pedem que a ensinem algo, que as ensinem alguma coisa que possa render algo). Isso para falar de uma família comum de Uganda. Não quero nem imaginar a vida de um morador de rua.
É extremamente difícil imaginar a realidade, mesmo que essa análise seja bem próxima como a minha, é mais fácil olhar de fora. Eu tenho pra onde voltar, sou graduada, tenho tratamento médico, tenho comida, tenho mãe e pai presentes, tenho uma justiça à apelar, tenho uma polícia à recorrer... Claro que essa não é a realidade da maioria dos brasileiros, mas é a minha e, com certeza, a sua que está lendo isso. E é por isso que estou falando da dificuldade de se colocar no lugar do nosso semelhante, justamente por que não os vemos como semelhantes. Não temos a mesma cor, religião, cultura, não frequentamos o mesmo bar, não vestimos a mesma roupa, não comemos a mesma comida...
Nessa lógica, por que os EUA se preocupariam com a morte dos somalis? Ou você pararia o seu dia super corrido para se preocupar se o mendigo da sua rua almoçou ou não?
Desculpa o pessimismo, mas talvez se mantiver sempre o idealismo não conseguirei nenhuma mudança real, baseadas no ser humano real, na realidade, nos governos e etc.
Ainda assim, se eu não acreditar no ‘one love’, que só os africanos sabem o significado, se eu não aprender com eles como dar a mão aos semelhantes (que inclui você aí branquinho brasileiro), sentarei, seguirei minha vida, pois a luta é nula, a melhora de um povo, uma pessoa, sempre significará a piora e morte de outro.
A luta é para que eu tenha menos e outros mais! Enquanto eu estiver ficada na luta pela minha promoção no fim do mês, não posso desejar um mundo mais justo.
Bato na tecla do ‘muda que o mundo muda com a gente’ de maneira chata e exaustiva, mas é para que eu mesma não esqueça de mudar TODOS OS DIAS os hábitos e verdades que me foram ensinados, enxergar meus semelhantes nas ruas, não ignorar meu irmão passando fome. Bato nessa tecla para tirar você da inércia do sistema, para que me ajude a ter forças para ir na contra-mão. Bato na tecla para que você pare de esperar a mudança do outro e para agir e pare de repetir o discurso de que “infelizmente é assim que as coisas são “ ou de que você “precisa pagar seu aluguel no fim do mês”.
Você precisa pagar seu aluguel no fim do mês ou precisa daquele sapato de 200 conto? Daquele happy hour no outback? Daquela balada openbar de 100 reais? Daquele carro dois anos mais novo que o seu? E, claro, pagar o aluguel do apartamento de 3 quartos em Perdizes?
“Infelizmente é assim que as coisas são”. Você está aceitando a morte de seus semelhantes pela fome ou por uma diarréia. Você tá aceitando que o dono da empresa que você trabalha ganhe 50 salários mínimos enquanto outros morrem de frio nas ruas. Você tá falando que aceita entrar na briga e está ao lado dos 50 salários mínimos, mesmo que isso signifique a morte de uma pessoa.

NÃO TENTE DIVIDIR A CULPA, POIS ELA É TODA  SUA!

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