domingo, 13 de março de 2011

Uganda: Pérola da África

Quando contei pra algumas pessoas que estava partindo em direção à Uganda, alguns, para não falar a maioria, reagiram: que legal! Vai morar na África do Sul de novo?
Posso entender a ignorância dessas pessoas, afinal Uganda é quase que perdida no mapa, na história. Mas não posso entender o por que?
Tá certo que a África é o continente esquecido mas por que Uganda é ainda mais marginilizada?
Vou fazer um batidão sobre a história recente do meu país e tentarei não ser entediante, afinal história é sempre um saco. A não ser que você tenha o Tota como professor.
Winston Churchill apelidou o Uganda como a "Pérola de África" e sabia do que falava.
Uganda é dos países deste continente onde mais se sente "África". País com a mais alta cordilheira de montanhas da África, as Rwenzori, país onde nasce o maior rio do Mundo, o Nilo, com o maior lago do continente, o Lago Victoria, e país no mundo mais densamente povoado de primatas, entre outros fatos.
Uganda é um dos países cujo cenário mais se enquadra na idéia romântica que muitas pessoas fazem da África: estradas em terra-vermelha, vegetação luxuriante de um verde difícil de acreditar, um povo simpático e humilde e parques naturais cheios de vida animal diversa. Tudo isso misturado com miséria, sofrimento e crueldade.
O reinado de terror vem desde os anos setenta, primeiro com Obote que se exilou em Dar Es Salaam, depois do golpe de estado do seu ministro da defesa Idi Amin´s ("Big Daddy". A ver ou rever um filme excelente baseado em Uganda daquele tempo e em Amin que é "O último rei da Escócia") e a sua perseguição política.  Toda a classe intelectual do país foi perseguida e assassinada, os estrangeiros expulsos do país, a economia colapsou, as infraestruturas arruinaram-se, a inflação bateu os 1000% e centenas de milhares de pessoas fugiram para países vizinhos.
Nessa altura, em finais dos anos 70, um dos poucos apoiantes e financiadores do governo de Uganda era o Coronel Gaddafi que "ajudava" este  governo corrupto em nome da "fraternidade Islâmica" (Amin nessa altura, muito convenientemente, já se tinha convertido ao Islão).
Depois de se ter voltado para o país vizinho, Tanzânia, e iniciado uma guerra sem qualquer motivo (a razão era que considerava que a Tanzânia albergava opositores ao seu governo), refugiou-se na Arábia Saudita onde viria a morrer em 2003, sem que a justiça tenha sido feita.
Deixou o país de rastos.
Tudo virou caos e Uganda, sem governo, ficou entregue a gangues de bandidos, fortemente armados que destroçaram o país com pilhagem e morte; deixou de haver comida, medicamentos e os refugiados começavam a regressar sem que o país tivesse condições para os receber.
Obote regressou do seu exílio e tomou o poder, uma vez mais, com o apoio da Tanzânia, e manteve no país o curso de destruição que Amin havia tomado, desta vez favorecendo a sua tribo.
Os jornalistas ocidentais foram expulsos e as diferentes tribos da de Obote foram perseguidas e mortas.
Em 1985 novo golpe de estado pelos militares chefiados por Tito Okello.
Okello não era o único oponente de Obote e depois de este se ter tornado presidente pela segunda vez uma guerrilha tinha começado a ser formada no Oeste de Uganda liderado por Museveni (atual presidente de Uganda) de nome Nacional Resistence Army (NRA).
O NRA acabou por tomar o poder atirando com as tropas de Okello para o norte, até ao Sudão.
O pesadelo parecia ter terminado para o povo de Uganda.
Nos anos que se seguiram acordos de paz foram feitos, quase meio milhão de refugiados regressou à Uganda, os serviços básicos foram restaurados, aumentou a produtividade do país, a agricultura cresceu, as estradas foram recuperadas e as infraestruturas restauradas.
Por mais de uma década Uganda foi a economia que mais cresceu em África atraindo investidores estrangeiros como nunca tinha acontecido até então.
Porém, o terror voltou à Uganda.
O grupo armado Lord´s Resistence Army (LRA), fundado no tempo do NRA e o seu líder Joseph Kony foram os responsáveis.
Kony, um homem com fortes perturbações mentais, passou a atacar soldados do NRA e a civis indefesos, mulheres e crianças, na sua bizarra tentativa de fundar um novo governo baseado nos Dez Mandamentos da Bíblia.
As suas tácticas incluem tortura, mutilação, violações e rapto de crianças para formar o seu exercito pessoal.
Mais de um milhão de pessoas do Nordeste do país fugiu para campos internos e ainda hoje, em 2011, milhares de crianças saem de suas casas todos os dias durante a noite e fazem largos quilômetros para dormirem em zonas mais seguras, como escolas e igrejas.
Documentário: Uganda´s Silent War
Por seu lado o exército do governo também cometeu atrocidades, na sua luta contra a guerrilha, fazendo ainda mais vítimas entre o povo sofredor de Uganda.
Museveni, que está no poder desde o final dos anos 80 e o país, apesar da elevada corrupção e marcadas divisões étnicas está relativamente calmo e seguro. Aliás, é por conta dessa segurança que Musevani continua sendo reeleito. Tudo que o povo quer é paz depois de tempos caóticos. Não importa se não tiverem comida, educação, se o governo é corrupto, nada disso importa se eles puderem viver em paz.
Este rápido resumo da história política do Uganda desde a sua independência, ajuda a melhor entender o estado do país e do que o seu povo passou.
A mim ajuda-me a relativizar acerca de assuntos que considero fundamentais na minha vida e a refletir sobre coisas que considero triviais e adquiridas no meu país, tais como Paz, Democracia, Liberdade e Direitos Humanos.
Apesar de todos estes anos de terror os Ugandeses são um povo positivo e alegre, humildes e educados.
De volta a Kampala, conhecida como a cidade das sete colinas, tal como Roma.
O que impressiona é a quantidade incrível de motos táxis que circulam na capital. Milhares de boda-bodas transportam pessoas (por vezes mais de 4 em cada um),mercadorias e animais.
Mercados, pequenos comércios, templos hindus, restaurantes de comida local, hotéis mexurucas e parques de táxis gigantescos enchem a cidade, tornando-a em alguns pontos caótica. Mas não tão caótico. Situações como essas seriam o fim do mundo no Brasil. Mas aqui, por que não temos a presença do governo, leis ou policiais para regerem e colocar 'a ordem', temos que ser o próprio governo. Ou seja, as coisas funcionam sem qualquer regra. Todos sabem como devem agir e todo realmente agem. O motorista do matato (taxi) sabe que o boda-boda irá cortá-lo por todas as partes. O pedestre sabe que essa coisa de mão única não tem nenhuma validade. Você não pede um capacete quando anda de boda-boda. Enfim, não sei realmente como explicar, mas as coisas realmente funcionam diante de um caos total.
                         

Pode parecer extremamente sujo, estressante, bagunçado, desregrado. E é, mas apenas para nós, mal acostumados com a organização, planejamento, policiamento, leis e etc. Aqui esse sistema é perfeito.

2 comentários:

Guilherme Cicerone disse...

Caralho, Bá. Eu fazia um pouco ideia da história de Uganda, mas ver você narrando assim faz dela maior do que parece no mapa da África. E, quer saber, realmente ela deve ser assim mesmo. Enorme, diversa, cultural, caótica...

Você comentou do filme "O Último Rei da Escócia" por conta da história da Uganda. É incrível esse filme. Mas, já que comentou da África do Sul, já assitiu "O Poder de Um Jovem"?

Essas fotos só estão melhorando. É bom ver um pouco do que você vê! Intensidade!

Anônimo disse...

bahhh vc eh do caralho menina como eu te disse vc tinha que fazer algo em serviço social tbm poxa aqui em op tds estao pirando com seu blog sua escolha de estar aee assim que puder me manda um email falando mais sobre seu projeto


bejos saudadee